Existe uma fala solta em Velozes & Furiosos 10 que, apesar de parecer piada, revela muito mais do que aparenta:
“É como uma seita, mas com carros.”
E é exatamente isso. Depois de mais de duas décadas, a franquia deixou de ser sobre corridas clandestinas e assaltos mirabolantes. Virou um tipo de mitologia moderna, onde velocidade, família e explosões convivem num universo que joga as regras do realismo pela janela. Aqui, o impossível não só acontece — ele é o ponto de partida.
Velozes 10 não tenta ser crível. Ele se alimenta justamente do absurdo. A lógica do roteiro não é só suspensa — ela é quase sabotada de propósito. Parece até que os roteiristas estão num duelo com o público: “vamos ver até onde vocês aguentam.”
E, surpreendentemente, a gente aguenta.
Dante Reyes: o caos como performance
Nesse universo onde o exagero é lei, Dante Reyes (Jason Momoa) entra em cena como o vilão mais performático da saga. Só que ele não quer dominar o mundo. Ele quer transformá-lo num espetáculo. Dante não é só caótico — ele faz da destruição um show, da vingança uma performance, do figurino uma declaração. Ele ri da lógica da franquia enquanto dança no meio de explosões.
Mais do que um vilão, ele é uma entidade. Um símbolo do imprevisível que rege esse universo onde a única regra é: tudo pode acontecer, e quanto mais absurdo, melhor.
Dom Toretto: a rocha no meio do furacão
Do outro lado está Dominic Toretto, o eterno pilar moral da história. Vin Diesel interpreta Dom com a mesma seriedade com que alguém recita um hino. Ele é o centro de gravidade de um mundo que vive girando fora de controle. Seus discursos sobre família, lealdade e “sentir o carro” já viraram mantras.
E por mais rígido que pareça, é essa rigidez que sustenta o caos ao redor.
Dom não precisa evoluir — ele precisa permanecer.
O roteiro, assinado por Justin Lin e Dan Mazeau, não está preocupado em construir uma história tradicional. O que vemos é mais um circuito de cenas espetaculares costuradas por frases de efeito e decisões que desafiam qualquer regra física.
O que importa aqui não é o que acontece, mas como acontece.
É uma espécie de cinema de impacto, feito não para ser lembrado em detalhes, mas para ser sentido como um soco de adrenalina.
Mesmo os atores parecem entrar no jogo. Estrelas com Oscars no currículo surgem como se estivessem brincando de blockbuster, posando em cenários globais, dizendo frases marcantes e sumindo logo depois. As mulheres da franquia, mesmo com menos tempo de tela, são tratadas quase como lendas urbanas — fortes, estilosas e envoltas em aura de mistério.
E talvez seja essa a mágica. Porque mesmo que você esqueça os detalhes do filme logo depois de sair do cinema, algo fica. Uma vibração, uma energia que te acompanha. Não se trata de lembrar diálogos ou tramas — trata-se de lembrar como foi sentir o filme.
Velozes & Furiosos 10 não quer que você acredite.
Quer que você se entregue.
É menos cinema e mais ritual — onde o que importa não é o sentido, mas o efeito.
E, nesse ponto, ele é absolutamente fiel a si mesmo.